segunda-feira, 26 de maio de 2008

O miolo das coisas


Estranha sociedade esta, a dos números. Gasta-se o tempo fazendo estudos para serem traduzidos em números, estatísticas para conferir números, previsões para antecipar números…
Mas, como diz Teixeira de Pascoais, a realidade (…) “Foge a todos os cálculos/ e a todos os olhos de vidro/ por mais longe que eles vejam, / quer se trate dum núcleo atómico/perdido no infinitamente pequeno/ou da nebulosa Andrómeda/ a seiscentos mil anos de luz da minha aldeia!

A essência das coisas,
essa verdade oculta na mentira,
é de natureza poética
e não científica.

Aparece ao luar da inspiração
e não à claridade fria da razão.
Esta apenas descobre
um simples jogo de forças
repetido ou modificado lentamente,
gestos insubstanciais,
formas ocas,
a casca dum fruto pribido.

Mas o miolo é do poeta.

Só ele saboreia a vida
até ao mais íntimo
do seu gosto amargoso,
e se embrenha nela
até ao mais profundo
das suas sensações e sentimentos.

É o ser interior a tudo.

Para ele, a realidade
não é um conceito abstracto,
ideia pura, imagem linear;

é uma concepção essencial,
imagem hipostasiada,
possuída em alma e corpo,
nupcialmente,
dramaticamente…”



(Carminda Marques)

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