terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Dia da Paz


"Depois fazia luar, fazia uma canção na noite"
(J. Gumarães Rosa)

Primeiro vieram os anjos, todos, escorrendo luz, porque bebem sem parar nas fontes luminosas. Bebem pela boca, pelos olhos, bebem pelo coração. O amor é assim. Uma sede inapagável, um ardor imortal.
Os anjos não podem evitar a luz. Onde aparecem, brilham. É deles. Brilham e cantam porque toda a luz inicia uma canção. Vivem felicíssimos.
Os pastores gritaram:
- Já é manhã!
Não acharam estranha a voz da nadrugada, as ardentes palavras da harmonia e da paz.
Os anjos arderam, cantando. Depois partiram e ficou luar.
O luar é o que resta da presença deles, a lembrança que tem a noite dos anjos indo embora, uma canção a afastar-se. Ecos no coração de uma bela harmonia. Ouve-se ainda.
Por isso é que o luar faz sempre saudades e os poetas cantam de noite. Sentem que passaram anjos. Vão atrás deles, a apanhar os restos das canções.
Todo o luar é natalício. Lembra canções de anjos.

Luís Silva Pereira, De Natal em Natal

Sem comentários: